A creatina (Cr) é um dos suplementos alimentares mais estudados no mundo todo. Devido a isso, muito se sabe sobre essa substância e sobre a sua função na ressíntese de ATP pela ação da enzima creatina fosfoquinase (CPK) ou apenas creatina quinase (CK). Seus efeitos mais consideráveis são de uso crônico, após semanas de suplementação.
Neste artigo, iremos conferir aprofundadamente tudo sobre a fisiologia da creatina (Cr) relacionada ao seu uso na ressíntese de ATP. Falaremos de diversos tópicos, dentre os quais:
Estrutura da Creatina
A creatina (Cr) é um composto nitrogenado formado por 3 aminoácidos diferentes: arginina, glicina e metionina. Esses aminoácidos irão ser os compostos bases para a formação da creatina pelo organismo (de maneira endógena). Dentre eles, a arginina e a glicina são aminoácidos do tipo não essenciais. Já a metionina é um aminoácido essencial que precisa ser ingerido por meio da nutrição.

Tomar esses aminoácidos de maneira isolada tem o mesmo efeito que tomar creatina?
Não, tomar os aminoácidos de maneira isolada não garante que o metabolismo irá utilizá-los para a síntese de creatina. Quando ingeridos separadamente, esses aminoácidos ficam disponibilizados para serem usados em diversas outras reações metabólicas.
Produção de Creatina pelo Organismo
A creatina (Cr) pode ser produzida de maneira endógena pelo organismo. Esse processo ocorre em duas etapas, primeiramente nos rins e posteriormente no fígado. Já adiantando, essa quantidade de creatina (Cr) produzida de forma natural é pouca e não se faz suficiente para fins de desempenho na prática de atividades físicas (cerca de 1g por dia).
Rins
Nos rins, é onde todo o processo de produção começa. A glicina irá se unir a uma parte da molécula da arginina pela ação da enzima amidinotransferase. O produto dessa reação será o ácido guanidinoacético, também chamado de guanidinoacetato, que será dispensado na corrente sanguínea e captado pelo fígado.
Essa mesma reação também forma um outro aminoácido como subproduto, a ornitina, que será utilizada em outras funções metabólicas.

Fígado
No fígado, o ácido guanidinoacético irá receber o grupamento metil (CH3), presente na metionina, com ação da enzima metiltransferase. Após isso, está formada a molécula de creatina (Cr) que irá seguir para a corrente sanguínea.
Algumas literaturas trazem a capacidade de o pâncreas atuar nesse processo e também produzir a molécula de creatina (Cr).

Outras fonte de Creatina
Além de produzida endogenamente, a creatina (Cr) está presente em uma série de alimentos, mesmo que em pequenas quantidades. Desses alimentos, os principais são as carnes. Proteínas derivadas das carnes (frango, peixe, boi etc) possuem algumas quantidades razoáveis de creatina (Cr). Segue a tabela com essas quantidades por quilo de carne.
CARNE | CREATINA (g/Kg) |
---|---|
Bacalhau | 3 |
Atum | 4 |
Salmão | 4,5 |
Aranque | 6-10 |
Carne de Vaca | 4,5 |
Carne de Porco | 5 |
Frango | 4 |
Pelo fato de a creatina (Cr) estar presente apenas nas carnes em quantidades consideráveis, veganos e vegetarianos tendem a ter níveis de fosfocreatina (PCr) menores no seu organismo. Até mesmo ovolactovegetarianos são afetados com isso, pois a creatina (Cr) também não está disponível em quantidades razoáveis nos ovos ou laticínios.
Mas, devido a essa baixa ingestão de proteínas por parte desse grupo, os estudos mostram que quando manipulada a suplementação da creatina (Cr), os vegetarianos e veganos em geral apresentam resultados mais acentuados no desempenho de força e na hipertrofia.
Armazenamento da Creatina
Após sair do fígado, a creatina (Cr) segue para diversos órgãos pela corrente sanguínea. Os principais órgãos de armazenamento dessa substância são:
- Músculo esquelético;
- Músculo cardíaco;
- Cérebro.
A maior parte do armazenamento se dá nesses 3 órgãos. Cerca 95% da creatina (Cr) total do corpo humano é armazenada no tecido muscular esquelético, e o restante, especialmente no músculo cardíaco e no cérebro.
Nos músculos, ela serve para aumentar a disponibilidade energética, melhorando o desempenho físico na prática de esportes ou nas atividades do dia a dia.
No coração, estudos mostram que a suplementação de creatina (Cr) pode influenciar na capacidade funcional desse músculo, ajudando até mesmo pacientes com insuficiência cardíaca, além de diversos outros efeitos.
Já no cérebro, percebeu-se uma melhora no desempenho cognitivo e resolução de situações de extremo esforço mental, como a resolução de problemas matemáticos, por exemplo.
Entretanto, a creatina (Cr) também pode ser armazenada e utilizada por outros órgãos, dentre os quais no:
- Tecido adiposo;
- Tecido imunológico;
- Etc.
Armazenamento no Músculo Esquelético
Uma vez disponível na corrente sanguínea, a creatina (Cr) entra nos músculos através de um transportador proteico chamado SLC6A8.
Estudos mostram que esse transportador pode ser estimulado quando na presença de insulina. Então, devido a esse fator, ingerir creatina (Cr) com uma alta quantidade de carboidratos e/ou proteínas parece ser um ponto diferencial na absorção dessa substância, uma vez que a ingestão desses macronutrientes estimula o processo digestivo e a liberação de insulina pelo pâncreas.

Dentro do músculo, a creatina (Cr) é convertida em fosfocreatina (PCr) por meio da adição de um grupo fosfato em sua estrutura molecular (fosforilação). É nessa forma que a creatina (Cr) é armazenada pelo tecido. Vale destacar que essa adição ocorre pela ação da enzima creatina quinase (CK), que retira o fósforo do ATP e o transfere para a molécula de creatina (Cr).

Mecanismos da Creatina
Existem basicamente 3 funções da creatina (Cr) que podemos enumerar como sendo os principais mecanismos de ação dessa substância:
INDICE
1. Tampão Energético
Exercendo a função de tampão energético, a fosfocreatina (PCr) atua fornecendo uma fonte rápida de energia para que as reações metabólicas não cessem.
No sistema de contração das fibras musculares, a partir do deslizamento da actina e da miosina, moléculas de ATP são hidrolisadas (quebradas) para que haja liberação de energia com a ação da enzima ATPase.
Após serem quebradas, as moléculas de ATP (adenosina trifosfato – com 3 fosfatos como o nome indica) se transformam agora em ADP (adenosina difosfato – com 2 fosfatos) pela perda de uma das moléculas de fosfato.
ATP + H2O → ADP + Pi + energia livre + H ๋
Esse ADP precisaria retornar a mitocôndria para receber novamente outro grupo fosfato e retornar a ATP, por meio da reação de fosforilação oxidativa. Entretanto, a fosfocreatina (PCr) pode agir evitando todo esse processo de deslocamento que, devido ao peso da molécula de ADP, demoraria para ocorrer e você precisaria interromper a série do treinamento pois não haveria mais energia disponível.
Assim, a fosfocreatina (PCr) sede sua molécula de fosfato, transformando o ADP rapidamente em ATP. Com esse sistema o ADP não precisa retornar a mitocôndria e o músculo consegue realizar mais trabalho em uma mesma série de uma determinada atividade física.
ADP + PCr + H ๋↔ ATP + Cr
Em outras palavras, essa função da fosfocreatina (PCr) consiste em não deixar faltar energia nas células que estão realizando trabalho por meio de inúmeras reações químicas.
2. Transporte de Energia
Pelo fato de o ADP ser uma molécula pesada, ela demora muito para se deslocar até a mitocôndria e ser fosforilada novamente. Por isso, outra das funções da creatina (Cr) é o transporte de energia.
A creatina (Cr) é cerca de duas mil vezes mais rápida que o ADP para retornar a mitocôndria. Com isso, a creatina (Cr) pode fazer esse trabalho, recebendo o fosfato (a partir da enzima creatina quinase), retornando (cerca de 4 vezes mais rápido que o ADP) e doando novamente esse fosfato para o ADP, sem que ele precise se deslocar.

3. Tampão de íons H+
A reação da quebra do ATP ocorre por meio da hidrólise, como vimos. Esse tipo de reação acaba liberando íons H+ no meio celular. Esses íons, quando livres, reduzem o pH e deixam o meio da suas células ácido, causando a sensação de ardor e queimação no músculo alvo.
Entretanto, a creatina (Cr) também pode atuar reduzindo essa acidez, exercendo a função de tamponamento desses prótons H+.
Quando a creatina (Cr) transforma o ADP novamente em ATP, ela utiliza íons H+. Assim, os íons liberados pela quebra do ATP serão reutilizados pela fosfocreatina (PCr) para transformar as moléculas de ADP em ATP. Assim, esses íons que foram liberados serão retirados do meio celular, reduzindo a sensação de acidez.

Conclusão
Essas são as principais descrições sobre a creatina, desde seu processo de formação até a sua utilização nos tecidos, principalmente no tecido muscular.
A fisiologia da creatina, aqui, foi trabalhada de maneira superficial para que você possa entender os principais mecanismos e os conceitos básicos de como a creatina atua no metabolismo humano. Caso queira aprofundar-se, busque literaturas de nutrição e de fisiologia do exercício, lá você poderá estudar esse processo de maneira mais profunda. Busque também artigos relativos à creatina, eles também costumam apresentar aprofundamentos.
No mais, é isso. A creatina é mais do que um simples suplemento; é uma ferramenta poderosa que, quando utilizada corretamente, pode proporcionar inúmeros benefícios fisiológicos, tanto esportivos quanto de saúde.